“Este é um grande passo em frente”: um passo decisivo contra a atrofia muscular espinhal com a triagem neonatal

Desde 1º de setembro, a atrofia muscular espinhal infantil (AME), uma doença genética rara e grave – juntamente com outras duas doenças (1) – está entre as patologias sistematicamente rastreadas ao nascer.
Realizado por meio de uma simples coleta de sangue nos primeiros dias de vida (teste do pezinho), esse rastreamento generalizado permite detectar a AME antes mesmo do aparecimento dos sintomas.
Este é um grande passo à frente, visto que, até agora, os bebês eram frequentemente diagnosticados tarde demais, quando os danos às células nervosas já estavam instalados.
" Este é um passo crucial", insiste a Dra. Caroline Perriard, neurologista pediátrica do Hospital Lenval e coordenadora do Centro de Referência para Doenças Neuromusculares Infantis, juntamente com o Dr. Christian Richelme. " Quanto mais cedo intervirmos, mais poderemos mudar a trajetória de vida dessas crianças. "
Uma doença genética gravePara entender a importância desse rastreamento generalizado, precisamos entender a natureza da atrofia muscular espinhal, uma doença neuromuscular que progride muito rapidamente desde os primeiros meses de vida.
" É causada por uma anormalidade no gene SMN1, essencial para a produção de uma proteína essencial à sobrevivência dos neurônios motores — as células nervosas que transmitem ordens do cérebro para os músculos. Quando esse gene está defeituoso, os neurônios motores se degeneram gradualmente, causando fraqueza muscular crescente ", explica o neurologista pediátrico.
Em bebês, os primeiros sintomas geralmente aparecem nos primeiros 6 meses de vida, sendo a forma mais grave e precoce, a atrofia muscular espinhal tipo 1.
" São frequentemente bebês muito hipotônicos, que podem ter dificuldade para se alimentar ou respirar. Durante o exame clínico, um sinal distintivo é a ausência de reflexos osteotendinosos (ausência de contração reflexa de um músculo)", explica o especialista.
Em sua forma mais grave, a doença progride rapidamente e, se não for tratada, pode ser fatal antes dos dois anos de idade.
Detecção precoce que muda tudoNos últimos anos, a terapia genética melhorou significativamente o prognóstico. " Uma única injeção (Zolgensma) substitui o gene doente por um saudável, tratando a doença na sua origem e, assim, preservando os neurônios motores."
No centro de referência de Nice, cinco crianças com AME que apresentavam sintomas se beneficiaram dessa terapia antes da implementação da triagem generalizada. "Elas foram diagnosticadas bem cedo. Estão se saindo bem e apresentam poucas sequelas", enfatiza o Dr. Perriard.
Mas para ser totalmente eficaz, a terapia genética deve ser administrada nos primeiros dias de vida, antes do início dos sintomas, como demonstrado pelo programa Depisma (veja o quadro).
Desde segunda-feira, a triagem neonatal generalizada para AME permitiu essa detecção precoce e, assim, mudou a vida das crianças. " É uma oportunidade real para que elas tenham um desenvolvimento motor normal", afirma o Dr. Perriard.
Suporte rápido e coordenadoPara garantir um acompanhamento eficaz, foi implementado um plano de cuidados estruturado. Em caso de triagem positiva, o neurologista pediátrico responsável (Dra. Cécile Halbert para a região de Marselha e Dr. Perriard para a região de Nice) é contatado e agenda uma consulta com os pais e o bebê o mais breve possível.
O diagnóstico é confirmado por meio de testes genéticos, seguido de uma avaliação completa para preparação do tratamento. A decisão de iniciar a terapia genética é sempre tomada coletivamente em nível nacional, e o tratamento está sendo administrado atualmente no Hospital Universitário Timone, em Marselha. "Em breve, essa terapia também estará disponível em Nice, o que facilitará muito a jornada das famílias afetadas."
Após a injeção, a criança permanece hospitalizada, geralmente por uma semana, sob observação rigorosa. " Há riscos de inflamação que podem afetar o fígado, o coração ou outros órgãos. Monitoramos tudo isso de perto", explica o médico.
Posteriormente, a criança passa por exames de sangue e consultas regulares para um acompanhamento ideal. " Hoje, a atrofia muscular espinhal não é mais inevitável, e temos os meios para oferecer a essas crianças um futuro radicalmente diferente."
1. Desde segunda-feira, a triagem neonatal foi ampliada para incluir, além da atrofia muscular espinhal, duas outras doenças raras e graves. - Imunodeficiência combinada grave (IDCG), que impede o bebê de desenvolver um sistema imunológico eficaz, tornando-o muito vulnerável a infecções fatais. Com a detecção precoce, um transplante de medula óssea realizado nos primeiros dois meses pode salvar essas crianças. - A deficiência de acil-coenzima A desidrogenase de cadeia muito longa (VLCAD), uma doença metabólica que bloqueia a conversão de certas gorduras em energia, agora também é detectada ao nascimento. O tratamento imediato, incluindo nutrição adequada, pode prevenir complicações graves.
A França atingiu esse marco graças ao programa piloto Depisma, lançado em 2023 nas regiões de Grand Est e Nouvelle-Aquitaine pela AFM-Téléthon, em parceria com os Hospitais Universitários de Estrasburgo e Bordeaux. "Este projeto teve como objetivo comprovar que o rastreio genético para atrofia muscular espinhal ao nascimento era viável e eficaz."
Em dois anos, mais de 185.000 bebês foram examinados. Treze deles foram diagnosticados como portadores e tratados, em média, apenas 21 dias após o nascimento, antes mesmo de apresentarem quaisquer sintomas. "A maioria deles agora vive sem sequelas graves. É esse resultado tão promissor que tornou possível generalizar esse exame em todo o país", afirma o Dr. Perriard.
Desde 1º de setembro, a atrofia muscular espinhal, a imunodeficiência combinada grave (SCID) e a deficiência de acil-coenzima A desidrogenase de cadeia muito longa (VLCAD) foram adicionadas às 13 doenças já rotineiramente rastreadas no nascimento, elevando o número total de condições cobertas para 16. Em 2018, esse programa ainda cobria apenas cinco doenças.
Essa triagem, realizada gratuitamente por meio do teste do pezinho e oferecida sistematicamente com o consentimento dos pais, permitiu o diagnóstico e o tratamento de quase 40.000 crianças doentes ao longo de cinquenta anos, mudando assim a vida de milhares de famílias.
No entanto, apesar desses avanços, a França está atrasada em relação a alguns de seus vizinhos europeus. Em uma dúzia de países, a atrofia muscular espinhal já faz parte da triagem neonatal há vários anos. Alguns países vão ainda mais longe: na Itália, por exemplo, mais de 40 doenças raras são detectadas ao nascer.
Nice Matin